quinta-feira, 10 de junho de 2010

Nevralgia Informacional



O mundo em uma teia, para citar o título mais notório, é um local digno de ser examinado mais próximo. Com uma lupa de aumento enxergamos a conectividade de um sistema frenético, estendendo seus tentáculos além do físico e do virtual, alimentando-se e crescendo em torno de uma rede. Ah, e não vá pensar que hoje falar em rede remete tão somente a internet. Sim, sim ela foi a mãe de todas as manifestações de conectividade digital, que hoje se desdobram em camadas de realidade, misturando o virtual e o físico por meio da alta circulação de energia (ou informação) causando uma entropia nas mentes... o que é, e da onde veio ninguém sabe mais... as fontes, leia-se propriedade intelectual, tornaram-se privilégio de uns poucos lunáticos (serão julgados assim cedo ou tarde) que recusam-se em aceitar os preceitos da teia. Os instantes que vivemos se sobrepõem, a aleatoriedade começa a dominar o tempo que começa a deixar de existir.. tende ao desaparecimento completo... a ausência. Os espaços cibernéticos que antes formavam um mundo paralelo hoje se fundiram ao mundo físico através do caos dificultando a vontade inerente de diferenciar experiências... existe um sentido único... uma constante jornada rumo a diminuição dos esforços... os estímulos são atiradas contra nós em alta velocidade rebatendo e continuando na mesma intensidade (ação e reação). Simplesmente chegou um momento onde transmissores e receptores de mensagens são qualquer um com poder de acesso, uma lista de endereços e um estado de expansão através da manipulação da rede. Como em um sistema a beira do caos, tudo pode ser feito... há uma ausência de regras e pré-concepções... é tudo multidimensional de uma maneira tal que não existe um modo de alinhar os acontecimentos... os bloqueios são temporários... as falhas eternas... a conexão hipertensa... olhamos para trás e não vemos mais o passado, olhamos para a frente e não vemos mais o futuro, mas tão somente instantes aleatórios, velocidade, nevralgia crônica suspendendo o tempo... Dessa hiper-sinpase descontinuada surgem muitas possibilidades... milhões que conhecem a tecnologia, nascidos e criados na era cibernética detém um alto grau de autonomia...podem fazer tudo ou nada, criar ou destruir, punir ou perdoar... deuses de 32 bits... quem realmente confia nesse fluxo anônimo...quem filtra a informação que recebemos??? Todos filtram tudo e ao mesmo não filtram nada!!! No tempo, o filtro tende a zero pelo alto grau de personalidades variadas que a mensagem fatalmente atinge. Esse alto fluxo gera uma diminuição da defesa, do grau de crítica (decorrente da queda na qualidade) e uma baixa reflexão, gerando atitudes condicionadas durante o ciclo da sinapse digital que é: receber, abrir, ler (rapidamente!! tem mais!!!) e encaminhar encerrando o círculo quando outro recebe... pode chamar isso do que quiser... internet, intranet, mensagem instantânea, redes sociais, blog, fórum, grupos, newsletter, cliente-servidor, listas de discussão... meios ativos com ambiente favorável para a procriação do vírus informacional.



Por Paulo Ricardo Zílio Abdala
Julho de 2004

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Mais fundo

Sentado na mesa habitual
Divagando sobre questões sem época
Pensando em acabar com as hipocrisias do mundo
Ir mais fundo, mais fundo, mais fundo
Com cheiro de queijo na mão
Abrindo softwares, janelas, espaços que não existem
Navegando em um mar de bits
Que chamaram de realidade virtual
Será que isso é mesmo real?
E se for, então como chamar o que sinto
O que pulsa em mim bem fundo
Sem ícones, sem letras, sem nomes
A totalidade do homem é tão real quanto o virtual?
Não sei... não sei...
E então, se a nuvem e o canto dos pássaros forem o que é real,
Quem sou eu que só vivo aqui há 30 anos?
E mal conheço a história desse lugar
Por isso eu digo e repito
É preciso ir mais fundo, mais fundo, mais fundo...
Em busca da verdade.. único objetivo de valor

sexta-feira, 19 de março de 2010

Ir



Despediu-se apressado...
Caminhou sem olhar para atrás
Seguindo por uma estrada desconhecida


Em algum ponto no meio da jornada
Sentiu uma sensação estranha
Havia deixado algo que não era mais seu
E estava indo para um lugar que não conhecia
Intrigado pela ausência de referências
Tinha no peito uma espécie rara de liberdade
Que vive no momento único no qual acontece
E não pode ser forjada, somente sentida


Uma idéia lhe passou voando pela mente:
"Quando o caminho confunde-se com o destino, o homem sabe que está indo na direção certa."


...sorriu e seguiu adiante...

segunda-feira, 15 de março de 2010

O Império do Consumo






Eduardo Galeano é um dos grandes escritores sulamericanos. Neste texto sobre consumo dá uma aula de visão crítica sobre o engôdo da sociedade ocidental de consumo. É um pouco longo, mas vale a pena. 






A explosão do consumo no mundo atual faz mais barulho do que todas as guerras e mais algazarra do que todos os carnavais. Como diz um velho provérbio turco, aquele que bebe a conta, fica bêbado em dobro. A gandaia aturde e anuvia o olhar; esta grande bebedeira universal parece não ter limites no tempo nem no espaço. Mas a cultura de consumo faz muito barulho, assim como o tambor, porque está vazia; e na hora da verdade, quando o estrondo cessa e acaba a festa, o bêbado acorda, sozinho, acompanhado pela sua sombra e pelos pratos quebrados que deve pagar. A expansão da demanda se choca com as fronteiras impostas pelo mesmo sistema que a gera. O sistema precisa de mercados cada vez mais abertos e mais amplos tanto quanto os pulmões precisam de ar e, ao mesmo tempo, requer que estejam no chão, como estão, os preços das matérias primas e da força de trabalho humana. O sistema fala em nome de todos, dirige a todos suas imperiosas ordens de consumo, entre todos espalha a febre compradora; mas não tem jeito: para quase todo o mundo esta aventura começa e termina na telinha da TV. A maioria, que contrai dívidas para ter coisas, termina tendo apenas dívidas para pagar suas dívidas que geram novas dívidas, e acaba consumindo fantasias que, às vezes, materializa cometendo delitos. O direito ao desperdício, privilégio de poucos, afirma ser a liberdade de todos.

Dize-me quanto consomes e te direi quanto vales. Esta civilização não deixa as flores dormirem, nem as galinhas, nem as pessoas. Nas estufas, as flores estão expostas à luz contínua, para fazer com que cresçam mais rapidamente. Nas fábricas de ovos, a noite também está proibida para as galinhas. E as pessoas estão condenadas à insônia, pela ansiedade de comprar e pela angústia de pagar. Este modo de vida não é muito bom para as pessoas, mas é muito bom para a indústria farmacêutica. Os EUA consomem metade dos calmantes, ansiolíticos e demais drogas químicas que são vendidas legalmente no mundo; e mais da metade das drogas proibidas que são vendidas ilegalmente, o que não é uma coisinha à-toa quando se leva em conta que os EUA contam com apenas cinco por cento da população mundial.

«Gente infeliz, essa que vive se comparando», lamenta uma mulher no bairro de Buceo, em Montevidéu. A dor de já não ser, que outrora cantava o tango, deu lugar à vergonha de não ter. Um homem pobre é um pobre homem. «Quando não tens nada, pensas que não vales nada», diz um rapaz no bairro Villa Fiorito, em Buenos Aires. E outro confirma, na cidade dominicana de San Francisco de Macorís: «Meus irmãos trabalham para as marcas. Vivem comprando etiquetas, e vivem suando feito loucos para pagar as prestações».

Invisível violência do mercado: a diversidade é inimiga da rentabilidade, e a uniformidade é que manda. A produção em série, em escala gigantesca, impõe em todas partes suas pautas obrigatórias de consumo. Esta ditadura da uniformização obrigatória é mais devastadora do que qualquer ditadura do partido único: impõe, no mundo inteiro, um modo de vida que reproduz seres humanos como fotocópias do consumidor exemplar.

O consumidor exemplar é o homem quieto. Esta civilização, que confunde quantidade com qualidade, confunde gordura com boa alimentação. Segundo a revista científica The Lancet, na última década a «obesidade mórbida» aumentou quase 30% entre a
população jovem dos países mais desenvolvidos. Entre as crianças norte-americanas, a obesidade aumentou 40% nos últimos dezesseis anos, segundo pesquisa recente do Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Colorado. O país que inventou as comidas e bebidas light, os diet food e os alimentos fat free, tem a maior quantidade de gordos do mundo. O consumidor exemplar desce do carro só para trabalhar e para assistir televisão. Sentado na frente da telinha, passa quatro horas por dia devorando comida plástica.

Vence o lixo fantasiado de comida: essa indústria está conquistando os paladares do mundo e está demolindo as tradições da cozinha local. Os costumes do bom comer, que vêm de longe, contam, em alguns países, milhares de anos de refinamento e diversidade e constituem um patrimônio coletivo que, de algum modo, está nos fogões de todos e não apenas na mesa dos ricos. Essas tradições, esses sinais de identidade cultural, essas festas da vida, estão sendo esmagadas, de modo fulminante, pela imposição do saber químico e único: a globalização do hambúrguer, a ditadura do fast food. A plastificação da comida em escala mundial, obra do McDonald´s, do Burger King e de outras fábricas, viola com sucesso o direito à autodeterminação da cozinha: direito sagrado, porque na boca a alma tem uma das suas portas.

A Copa do Mundo de futebol de 1998 confirmou para nós, entre outras coisas, que o cartão MasterCard tonifica os músculos, que a Coca-Cola proporciona eterna juventude e que o cardápio do McDonald´s não pode faltar na barriga de um bom atleta. O imenso exército do McDonald´s dispara hambúrgueres nas bocas das crianças e dos adultos no planeta inteiro. O duplo arco dessa M serviu como estandarte, durante a recente conquista dos países do Leste Europeu.

As filas na frente do McDonald´s de Moscou, inaugurado em 1990 com bandas e fanfarras, simbolizaram a vitória do Ocidente com tanta eloqüência quanto a queda do Muro de Berlim. Um sinal dos tempos: essa empresa, que encarna as virtudes do mundo livre, nega aos seus empregados a liberdade de filiar-se a qualquer sindicato. O McDonald´s viola, assim, um direito legalmente consagrado nos muitos países onde opera. Em 1997, alguns trabalhadores, membros disso que a empresa chama de Macfamília, tentaram sindicalizar-se em um restaurante de Montreal, no Canadá: o restaurante fechou. Mas, em 98, outros empregados do McDonald´s, em uma pequena cidade próxima a Vancouver, conseguiram essa conquista, digna do Guinness.

As massas consumidoras recebem ordens em um idioma universal: a publicidade conseguiu aquilo que o esperanto quis e não pôde.

Qualquer um entende, em qualquer lugar, as mensagens que a televisão transmite. No último quarto de século, os gastos em propaganda dobraram no mundo todo. Graças a isso, as crianças pobres bebem cada vez mais Coca-Cola e cada vez menos leite e o tempo de lazer vai se tornando tempo de consumo obrigatório. Tempo livre, tempo prisioneiro: as casas muito pobres não têm cama, mas têm televisão, e a televisão está com a palavra. Comprado em prestações, esse animalzinho é uma prova da vocação democrática do progresso: não escuta ninguém, mas fala para todos.

Pobres e ricos conhecem, assim, as qualidades dos automóveis do último modelo, e pobres e ricos ficam sabendo das vantajosas taxas de juros que tal ou qual banco oferece. Os especialistas sabem transformar as mercadorias em mágicos conjuntos contra a solidão. As coisas possuem atributos humanos: acariciam, fazem companhia, compreendem, ajudam, o perfume te beija e o carro é o amigo que nunca falha. A cultura do consumo fez da solidão o mais lucrativo dos mercados.

Os buracos no peito são preenchidos enchendo-os de coisas, ou sonhando com fazer isso. E as coisas não só podem abraçar: elas também podem ser símbolos de ascensão social, salvo-condutos para atravessar as alfândegas da sociedade de classes, chaves que abrem as portas proibidas. Quanto mais exclusivas, melhor: as coisas escolhem você e salvam você do anonimato das multidões. A publicidade não informa sobre o produto que vende, ou faz isso muito raramente. Isso é o que menos importa. Sua função primordial consiste em compensar frustrações e alimentar fantasias. Comprando este creme de barbear, você quer se transformar em quem?

O criminologista Anthony Platt observou que os delitos das ruas não são fruto somente da extrema pobreza. Também são fruto da ética individualista. A obsessão social pelo sucesso, diz Platt, incide decisivamente sobre a apropriação ilegal das coisas. Eu sempre ouvi dizer que o dinheiro não trás felicidade; mas qualquer pobre que assista televisão tem motivos de sobra para acreditar que o dinheiro trás algo tão parecido que a diferença é assunto para especialistas.

Segundo o historiador Eric Hobsbawm, o século XX marcou o fim de sete mil anos de vida humana centrada na agricultura, desde que apareceram os primeiros cultivos, no final do paleolítico. A população mundial torna-se urbana, os camponeses tornam-se cidadãos. Na América Latina temos campos sem ninguém e enormes formigueiros urbanos: as maiores cidades do mundo, e as mais injustas. Expulsos pela agricultura moderna de exportação e pela erosão das suas terras, os camponeses invadem os subúrbios. Eles acreditam que Deus está em todas partes, mas por experiência própria sabem que atende nos grandes centros urbanos.

As cidades prometem trabalho, prosperidade, um futuro para os filhos. Nos campos, os esperadores olham a vida passar, e morrem bocejando; nas cidades, a vida acontece e chama. Amontoados em cortiços, a primeira coisa que os recém chegados descobrem é que o trabalho falta e os braços sobram, que nada é de graça e que os artigos de luxo mais caros são o ar e o silêncio.

Enquanto o século XIV nascia, o padre Giordano da Rivalto pronunciou, em Florença, um elogio das cidades. Disse que as cidades cresciam «porque as pessoas sentem gosto em juntar-se». Juntar-se, encontrar-se. Mas, quem encontra com quem? A esperança encontra-se com a realidade? O desejo, encontra-se com o mundo? E as pessoas, encontram-se com as pessoas?Se as relações humanas foram reduzidas a relações entre coisas, quanta gente encontra-se com as coisas?

O mundo inteiro tende a transformar-se em uma grande tela de televisão, na qual as coisas se olham mas não se tocam. As mercadorias em oferta invadem e privatizam os espaços públicos.

Os terminais de ônibus e as estações de trens, que até pouco tempo atrás eram espaços de encontro entre pessoas, estão se transformando, agora, em espaços de exibição comercial. O shopping center, o centro comercial, vitrine de todas as vitrines, impõe sua presença esmagadora. As multidões concorrem, em peregrinação, a esse templo maior das missas do consumo. A maioria dos devotos contempla, em êxtase, as coisas que seus bolsos não podem pagar, enquanto a minoria compradora é submetida ao bombardeio da oferta incessante e extenuante. A multidão, que sobe e desce pelas escadas mecânicas, viaja pelo mundo: os manequins vestem como em Milão ou Paris e as máquinas soam como em Chicago; e para ver e ouvir não é preciso pagar passagem. Os turistas vindos das cidades do interior, ou das cidades que ainda não mereceram estas benesses da felicidade moderna, posam para a foto, aos pés das marcas internacionais mais famosas, tal e como antes posavam aos pés da estátua do prócer na praça.

Beatriz Solano observou que os habitantes dos bairros suburbanos vão ao center, ao shopping center, como antes iam até o centro. O tradicional passeio do fim-de-semana até o centro da cidade tende a ser substituído pela excursão até esses centros urbanos. De banho tomado, arrumados e penteados, vestidos com suas melhores galas, os visitantes vêm para uma festa à qual não foram convidados, mas podem olhar tudo. Famílias inteiras empreendem a viagem na cápsula espacial que percorre o universo do consumo, onde a estética do mercado desenhou uma paisagem alucinante de modelos, marcas e etiquetas.

A cultura do consumo, cultura do efêmero, condena tudo à descartabilidade midiática. Tudo muda no ritmo vertiginoso da moda, colocada à serviço da necessidade de vender. As coisas envelhecem num piscar de olhos, para serem substituídas por outras coisas de vida fugaz. Hoje, quando o único que permanece é a insegurança, as mercadorias, fabricadas para não durar, são tão voláteis quanto o capital que as financia e o trabalho que as gera. O dinheiro voa na velocidade da luz: ontem estava lá, hoje está aqui, amanhã quem sabe onde, e todo trabalhador é um desempregado em potencial.

Paradoxalmente, os shoppings centers, reinos da fugacidade, oferecem a mais bem-sucedida ilusão de segurança. Eles resistem fora do tempo, sem idade e sem raiz, sem noite e sem dia e sem memória, e existem fora do espaço, além das turbulências da perigosa realidade do mundo.

Os donos do mundo usam o mundo como se fosse descartável: uma mercadoria de vida efêmera, que se esgota assim como se esgotam, pouco depois de nascer, as imagens disparadas pela metralhadora da televisão e as modas e os ídolos que a publicidade lança, sem pausa, no mercado. Mas, para qual outro mundo vamos nos mudar? Estamos todos obrigados a acreditar na historinha de que Deus vendeu o planeta para umas poucas empresas porque, estando de mau humor, decidiu privatizar o universo? A sociedade de consumo é uma armadilha para pegar bobos.

Aqueles que comandam o jogo fazem de conta que não sabem disso, mas qualquer um que tenha olhos na cara pode ver que a grande maioria das pessoas consome pouco, pouquinho e nada, necessariamente, para garantir a existência da pouca natureza que nos resta. A injustiça social não é um erro por corrigir, nem um defeito por superar: é uma necessidade essencial. Não existe natureza capaz de alimentar um shopping center do tamanho do planeta. 




Eduardo Galeano é escritor uruguaio, autor de As veias abertas da América Latina..

Tradução: Verso Tradutores

Fonte: Agência Carta Maior

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Desafie sua mente






A sociedade é um sistema complexo que cria pontes entre os indivíduos, suas personalidades, e os papéis sociais que devem ser desempenhados para que o todo continue a funcionar. Sempre tive uma dúvida: se somos individualmente tão diferentes uns dos outros, o que mantém as coisas mais ou menos constantes ao longo do tempo? A resposta agora me parece simples: somos nós mesmos. A realidade depende de todos para continuar sendo real. É a própria descrição de mundo dos participantes deste próprio mundo que o faz seguir tendo a mesma estrutura. Ao olhar para uma situação e avaliá-la, externando uma opinião a partir da consciência discursiva (tenha ela a valência que tiver), estamos reforçando aquela determinada forma de ação, contribuindo para a retroalimentação do sistema. Se, por exemplo, eu acreditar que algumas atitudes são aceitáveis e outras não, me baseando em critérios que me foram ensinados desde uma idade muito primária, eu estou, mesmo de maneira inadvertida, praticando o lado mais normativo e mecânico do jogo social. Avaliações tendem a manter as coisas como são, assim como conceitos e definições. Ao vermos uma mãe que sempre reclama as mesmas coisas do filho, podemos perceber que a reclamação é ao mesmo tempo uma observação de um comportamento, e uma reflexividade que mantém aquele comportamento exatamente da maneira percebida e descrita. "Sou assim mesmo", admite o filho, e o ciclo da existência recomeça. 


Olhando a questão mais profundamente percebemos que o ser humano estruturou sua forma social de vida de uma maneira muito astuta do ponto de vista de sua segurança psicológica. A rotina é segura, os rótulos que a história nos oferece nos deixam mais tranqüilos dentro de uma concepção (questionável) de que conhecemos a vida e suas manifestações. Uma frase de Durkhein: "a sociedade está na mente das pessoas", é um resumo brilhante desse modo de operar. Nos venderam liberdade, mas nos entregam limites. Compramos escolhas, mas recebemos caminhos traçados.

E como transformar este ciclo? Como quebrar a inércia da estabilidade inerente ao sistema? O primeiro esforço individual deve vir no sentido de "parar o mundo", para utilizar a expressão de Castaneda, ou seja, parar de tentar descrever a realidade a todo instante, justificando e identificando posições e situações. Sem o reforço da consciência, a ilusão da realidade à la Matrix entra em colapso, dando espaço para o silêncio e as infinitas possibilidades presentes na natureza mais profunda de nossa constituição.



Desafie sua mente!



terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Vida livre





Hábitos são ações condicionadas pela história pessoal, repetições do lado mecânico e compulsivo de nossa consciência moldada pela urbanidade. É quem pensamos ser que nos mantém como pensamos ser. Nos vemos humanos, inteligentes e capazes, esquecendo dos animais que habitam dentro de nós e pedem passagem para ser livres, para voar, rosnar, correr, rugir... somos um cativeiro de instintos e vontades, um conteiner que se enche na medida em que nos reprimimos, e que um dia qualquer vaza, extravasa, rasga o véu aparente de nossa polidez. É preciso uma grande dose de energia para se libertar das amarras do eu. Para perder a ilusão do controle. Para ouvir o chamado. Romper as descrições de nós mesmos, desestruturar os velhos conceitos, o ciclo no qual fomos concebidos, a rotina, os mesmos padrões de pensar e agir... o turbilhão.................................................................


........................... o silêncio... no silêncio há uma voz suave... a voz da essência... que vem nos contar belas histórias sobre novas possibilidades... e ao ouvir tamanha leveza a alma sorri como quem pela primeira vez vai ao circo... com a inocência do peito aberto... nada a perder.. nada a ganhar... nenhum lugar para ir... somente uma sensação de felicidade... a alegria verdadeira que mora no coração, e que por vezes, quando consegue vir à tona, mostra o estado de graça que está ao alcance de todos... todos... sem exceção... é um caminho difícil.. requer atenção impecável, vontade e muita disposição... dizem que somos um somatório de nossas escolhas... eu definitivamente escolhi caminhar... firme na trilha mais longa, mais íngreme, mais complicada, que me levará ao lugar mais belo de todos: uma vida livre!


segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Derretendo


No calor do verão as horas passam mais lentas. Como se os ponteiros derretessem em um surreal relógio de Dali. Olho através da janela fechada, de dentro do ambiente climatizado, e posso sentir o calor na copa das árvores tremulas. Há uma brisa quente que lembra o ar que sai quando se abre o forno da cozinha. Há uma aparente calma na cidade vazia, parada, por vezes melancólica. Saio na rua, me sinto pegajoso, estou derretendo junto com os relógios e os sorvetes. Reclamar é fácil e pouco ajuda, mas existem momentos em que é difícil de resistir à tentação delirante de querer estar em outro lugar... felizes são os cubos de gelo no meu freezer...


...dez graus a menos por favor!