quarta-feira, 6 de maio de 2009

O último ensinamento



Baseado em uma bela história contada por um buscador xamânico.









Era um índio de espírito forte, homem sábio, de poucas e sinceras palavras certeiras. Seu olhar de águia tinha um brilho de estrela em noite sem lua. Costumava fitar o horizonte, além, como se enxergasse mais do que os olhos vêem. Tinha uma integridade, uma certa postura frente à vida, um jeito de se movimentar, que inspirava confiança e força. Sabia falar bem, mas sabia calar melhor, costumava dizer que o homem tem dois ouvidos e uma boca não por mero acaso. Aliás sempre lembrava a todos que o acaso era um disfarce do grande mistério (conhecido por nós como Deus) para atingir o coração dos sem fé. Este homem era respeitado por todos pela simples energia vibrante de sua presença. Era um sujeito sério e sorridente, alegre e livre, leve mas imponente, e tinha uma vontade que nada poderia parar. Era um xamã, um filho do trovão com o vento, sobrinho do mar, primo do sol, irmão da terra, amigo intímo dos animais e das árvores, e amante da lua. Um buscador e sonhador, um guerreiro e visionário que percebia todos os sinais do universo em sua volta, os transformando em conhecimento.

Certa vez, já cansado e com a idade avançada, deitou-se em sua cama pronto para a última jornada. Era chegada a hora de partir para estrada azul do espírito através do portal do leste (local onde a estrada vermelha - nossa caminhada na terra - começa e termina). A notícia logo se espalhou, e em pouco tempo seus admiradores e discípulos juntaram-se em sua volta para honrar o mestre pela última vez, todos muito emocionados. Nervoso e triste, um dos rapazes mais velhos se dirigiu a ele pedindo uma última mensagem de sabedoria, algumas últimas palavras para eles levarem consigo. O velho índio o olhou nos olhos e pediu um favor, gostaria de comer um pedaço de sua torta predileta, a que ele mais gostava, antes de proferir o tal ensinamento final. Alguns saíram e foram providenciar a torta, logo trazendo um belo pedaço para o velho Xamã, que saboreou cada garfada com uma expressão sincera de agradecimento. Enquanto a torta ia acabando, as pessoas na sala se enchiam de expectativa sobre a grande mensagem que viria a seguir. E então, quando chegou o momento do último pedaço, todos se curvaram para ouvir melhor. Fez-se o silêncio do vazio na sala, todos olhando para o mestre que apenas sorriu, dando um longo e grande suspiro de prazer antes de fechar os olhos e partir.


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